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Aqui vou guardar alguns dos posts que escrevi no Blasfémias, é não só, e que pretendo ter «à mão». Não vai ter mais do que uma função de aquivo.




«O que é um Esquerdista?», pergunta o meu amigo Gabriel


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A propósito de um post meu, pergunta o Gabriel Silva:

O que é um esquerdista? Um comunista, um socialista, um social-democrata, um democrata-cristão? Todos?
Gabriel Silva Homepage 10.21.05 - 12:22 am #

Meu caro Gabriel,

Esquerdista, no século XXI, é alguém que culpabiliza a «globalização» pelo «actual estado de coisas»; que considera que o mundo está caótico devido a uma «deriva neo-liberal» que enraizada nos centros de poder visa malevolamente «destruir os direitos dos trabalhadores conquistados a pulso por dois séculos de lutas»; é alguém que reconhece que há uma «crise», mas que se recusa a priori a pôr em causa «o modelo social europeu», altura do debate em que o elevar da voz e o discurso radical impedem qualquer discussão analítica e objectiva; é alguém que se diz progressista e se julga de mente aberta mas que impede qualquer ímpeto reformista que ponha em causa o seu status quo; é, portanto, um conservador, embora esteja convencido do contrário, porque defende acerrimamente a alteração do status quo do «vizinho do lado», sobretudo se tiver cometido o pecado capital de acumular licitamente e pelo seu mérito qualquer riqueza; é alguém que afirma com forte convicção ser «essencial manter a coesão social», traduzindo-se essa «coesão», na prática, precisamente no contrário, numa «manutenção de privilégios», nem que seja à custa da fractura e desagregação sociais e no avolumar das explorações interclassistas e geracionais.

Ser Esquerdista é ter como prioridade o «combate ao desemprego», mas com uma perspectiva enviesada, apresentando o emprego, criado por decreto e protegido por mecanismos legais, como o impulsionador do crescimento económico; ignorando ser a produtividade e a competitividade os motores do emprego e da estabilidade laboral.

Ser Esquerdista é dizer que Cavaco Silva, apesar de ser social-democrata, é de Direita, porque «tem o apoio do grande capital e dos poderosos, que se arregimentaram em redor da sua candidatura». Ser Esquerdista é ter sempre um dedo indicador em riste contra a Direita, acusando-a de ser «Fascista», ao mesmo tempo que se fala com ternura, recordando a Sierra Maestra e histórias mirabolantes de Che Messias e seus Apóstolos, de regimes opressores e ditadores facínoras; ser Esquerdista significa defender ao mesmo tempo o Pluralismo e uma Educação de sentido único, sem considerar existir aí qualquer contradição intrínseca; ser Esquerdista significa, em muitos casos, dizer-se amante da Cultura sem comprar um livro, defender a subsidiação de espectáculos que ninguém vê, na esperança que daí surja um Bach ou um Verdi, ser a favor de uma RTP 2 pública, mas estar sempre «ligado» na TVI.

Ser Esquerdista é considerar pacífica a ideia de que é necessário combater a política «imperialista de George W. Bush e dos EUA», sem se dar ao trabalho de compreender o fenómeno político norte-americano; significa ser-se receptivo à ideia de que nos EUA existe um «Terceiro Mundo», insultando com isso os países que vivem efectivamente na pobreza e na miséria; significa ser-se sempre contra Israel, e a favor da Palestina, sem conseguir explicar porquê.

Ser Esquerdista é ser-se a favor do combate à fome em África, obviamente por via da solidariedade, das campanhas pro-esmola e de manifestações civico-musicais que ajudam a acalmar as consciências e aliviam a alma; numa versão mais radical podem partir-se montras de multinacionais opressoras; ser Esquerdista é recusar que a solução para a fome e para a doença nos países pobres passa em grande medida pelo fim das barreiras alfandegárias e pela implementação de regras justas no comércio internacional, fonte de efectivo progresso, por se considerar que isso põe em causa o «Modelo Social Europeu» e abre lugar à exploração «neo-capitalista» (tem de ser «neo» senão lá se perde a carga pejorativa) de povos miseráveis que deveriam mas é reivindicar o direito a férias, a subsídios, a reformas e não ficarem satisfeitos, nesta fase do seu desenvolvimento e face aos seus níveis de produtividade, com a possibilidade de trabalhar para matar a fome e adquirirem por essa via alguma dignidade. Ser Esquerdista é não ver qualquer contradição entre a defesa do fim dos «Muros da Vergonha» em Ceuta e Melilla e a manutenção dos verdadeiros «Muros» que são as barreiras alfandegárias e os subsídios à Agricultura na União Europeia.

Ser Esquerdista hoje é ter medo da mudança. É desprezar a «Economia» em favor das «Pessoas», ignorando que os recursos são escassos. É confundir Produção e Crescimento com Redistribuição. É viver convencido que há almoços grátis e soluções sem esforço. É acreditar que existem ricos em número suficiente para «pagar a crise», não compreendendo que essa mais não é do que uma forma retórica ardilosa de onerar as classes médias.

Ser Esquerdista, hoje, é mais ou menos isto. Quem se revê numa boa parte destas ideias mas, de uma forma constrangida, aceita «ceder» em alguns pontos para «salvar o Modelo Social Europeu», é um «moderado» Socialista/Social-Democrata/Democrata-Cristão, conforme a roupagem que cada um prefere vestir. Os que não cedem nem uma vírgula, numa atitude conservadora, são Comunistas. Os que vivem obcecados com o Bush e com os EUA, com a falta de subsídios à cultura, gostam de roupa de marca, não lhes passa pela cabeça trabalhar numa linha de produção, mas desejam ainda no seu íntimo a Revolta do Proletariado, onde eles mandem, são do Bloco de Esquerda, ou então «anacletos neo-submarinos», militantes do PS que votam às escondidas na «Esquerda Lux».

Certo é que, no início deste novo século, o «Fim da História» está longe de estar escrito; a «Revisão da História», essa sim, foi devidamente promovida, e as Novas Esquerdas, com discursos bem recalibrados, com novos «amanhãs que cantam», libertos dos constrangimentos criados pela Queda do Muro de Berlim, estão aí, dispostas a distribuir «ópio ao povo».

Rodrigo Adão da Fonseca

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